27.7.09

A que será que se destina?

Hoje eu decido desafiar a inspiração. Quero escrever, mas não sei o quê. Mas também não quero só imprimir palavras no papel. Ta aí! Escrever não é mesmo só borrar de tinta esse branco papel? Eu busco uma resposta.
Há tempos essa questão martela na minha cabeça. Porque escrever?
Um verso do Pessoa diz: “O sol doira sem literatura.”. Os dias continuam a suceder-se quando não escrevo. É claro que o eu-lírico do verso não coincide com o autor, até porque o Pessoa entendia que ele tinha como missão “alargar a consciência da humanidade”, obviamente pela sua obra. Um tanto pretensioso.
A princípio eu sinceramente não escrevia pra ser lido. Era só um exercício íntimo de autoconhecimento. Mas hoje há sentido em comunicar. Há algum tempo, pra mim, a literatura e toda arte era meio estrito para a transformação pessoal, individual. Aquelas obras que almejam algo mais do que isso eram mera utopia. Desde os romances panfletários do Jorge Amado, até o realismo fantástico dos escritores latinos que buscavam senão ideologizar, ao menos conscientizar. Excluo obviamente os auto-ajudas da vida, que estão longe de incitar qualquer transformação.
A transformação do indivíduo talvez seja meio pra transformação da sociedade. Mas utopicamente, prefiro crer que o que existe é um intercâmbio de conhecimento. Não há obra ou texto que sozinhos operem mudança radical. Escritor e leitor criam juntos o saber. E por crer nisso não me interesso que o meu texto seja acabado. Ele é imperfeito, naturalmente, e muito imperfeito. Mas é assim que eu gosto. As incongruências podem também gerar um questionamento. E se isso for meio pra uma possível transformação, essa é a minha resposta.
Arte pra mim é sentimento que extravasa e que escapa ao ser. Algo espontâneo que não é capaz de ser contido e que por caminhos tortuosos sai do abstrato para o concreto. E por isso é imperfeita, passível de nascer das maiores escatologias.
O dilema está principalmente em congregar o eu e o nós. E admiro o Graciliano, (ele que, se há perfeição, esteve muito perto dela) entre outras razões, por isso. Ele teve peito pra abandonar a atitude predominantemente panfletária do Romance de 30. Não foi por isso que expurgou da obra dele o tom ideológico. A ideologia dele manifesta-se por meios mais sinuosos. Era através da escavação psicológica dos seus personagens que dava voz à opressão sócio-econômica que inevitavelmente precisaria ser ouvida. Conciliou com harmonia o homem e o meio.
Coisa pra mestres. Enquanto isso eu me viro com o que posso. Escrevo um pouco sobre o que se passa aqui na minha cabeça, um pouco sobre o que eu percebo do se passa diante dos meus olhos.

3.7.09

Outono de Brasília

Já inventaram mais de uma dezena de "Primaveras". A mais conhecida é a de Praga, a última dizem que acontece em Teerã. Mas pra falar a verdade eu sou meio cético com relação ao romantismo dos nomes dados a esses movimentos. Às vezes num mal súbito até chego a imaginar a "Primavera do Rio", em que o povo daria um “basta!” na violência (sonho burguês); a “Primavera de Bagdá" com os iraquianos resistindo à opressão ianque (sonho antiamericano); e vai por aí vai, primaveras dos mais variados gêneros.
Mas daí eu lembro que eu tenho um pé fincado no chão e que não me deixa sonhar muito, e que eu moro no Brasil. Os mais precipitados podem achar que agora eu vou vomitar asneiras anti-brasileiras à la Diogo Mainardi. Mas diferente do Diogo, acho que as minhas expectativas são bem mais... risíveis ou patéticas, se é possível.
Na minha cabeça, e eu creio nisso, o florescer do Brasil é um florescer eterno, um sonho intenso, diria Bilac, delirante pra mim. Um florescer que de tão demorado um dia acaba e as flores caem, assim, sem nem terem desabrochado. E desse jeito era uma vez o “florão da América”, aquele país do futuro. Pessimismos infantis à parte, só sei que a gente parece viver há uns 100 anos o porvir. Mas que a gente sempre esbarra em miudezas e por vezes em graudezas.
Quem sabe toda essa divagação seja inútil ou seja só uma sensação. E acho que é, por causa da política. Ou por causa de um rosto: Sarney, ou Sir Ney, como queiram. Ele me faz sentir que aqui há pouca ordem e pouco progresso. Esse homem é a personificação do que eu disse no parágrafo anterior. Dizem que quando ele surgiu pro público era o messias, o rosto da renovação, do novo jeito de fazer política (é normal um déjà vu nessa hora). Hoje... Bom, não preciso nem terminar a história. O Sarney é uma promessa inacabada igual à do chavão do “país do futuro”. Um eterno porvir. Acho que ele até acha que tem alguém que acha ele vale um voto e vá lá, talvez valha, talvez seja só conto de fadas, talvez seja hora dele sair de cena. Mereçe um fim abrupto.
Enfim, é desse jeito que a gente vai levando: devargar, devagarinho. Esperando o outono mas crendo que a primavera brasillis não tem fim.

Alguém há de ler e de me entender.